terça-feira, 29 de abril de 2008

O mundo dos restos.


Não gosto de juntar restos de comida. O nojo é o lugar comum quando se trata de restos. Mas tenho que juntar e limpar para depois sair e trabalhar. Hoje não. Hoje vou para a praia. Uma falta a mais ou a menos e vou continuar ganhando uma merreca. Vou para a praia pelo caminho habitual e sou surpreendido por uma mulher: - Tá indo para a praia? – Tô. – Posso ir contigo? – Pode sim. Observo-a. Bonita. Pretinha. Seios médios. Bunda empinada. Eh, descrição de conto erótico. Com exceção da “pretinha”. Pergunta se eu moro por aqui. – Sim, eu moro. – Mas hoje é quinta feira, deveria estar trabalhando. – Ó, você também. Ela ri. A descontração favorece a caminhada. – Trabalha em quê? – Sou educador e você? – Sou psiquiatra. – É? – É, por que o espanto? – Força do estereótipo. – É, tinha percebido, meu corpo dá essa impressão, né. Papo estranho. Ser provocado pela manhã não faz muito sentido. Gostei dela mesmo assim. E assim caminhamos em direção à praia. Ela pergunta qual é a minha motivação em ser educador. – Concurso Público. Eu pergunto qual é a motivação dela em ser psiquiatra. – Saber a motivação dos outros. - E o que concluiu? – Que a praia é muito bonita. Resposta evasiva. Talvez ela esteja me testando. Quer ver se eu sou inteligente. Não estou a fim de perguntar mais nada. Vamos pra praia. Vamos pra praia. Ela quer caminhar. Eu quero contemplar o mar. – Está cansado da rotina, né? – É, estou. – Quebrei sua expectativa? – Expectativa? – Você gostou do meu corpo e eu tentei mostrar que sou mais do que um corpo bonito, e você não gostou. – Você tem sempre certeza dos seus diagnósticos? – Talvez. – Ah, tá bom, quer sentar? – Quero. Ela me explica sobre os movimentos constantes das ondas e a tentativa de adequação da psiquê para ser similar às ondas. Ela também me explica que gosta de provocar os homens a partir da imagem comum da mulher negra e que a quebra de expectativa gera frustração, afastamento ou paixão avassaladora. – E o meio-termo, não cogita? – Bom, a provocação é para os extremos. E então, ela me mostra o seio esquerdo. Fico abismado. Fico excitado e isso fica perceptível. Seio médio, durinho, redondinho, um tesão, ummmmmmmmmmmmmmmm. – Tá vendo, sua excitação é visível pelo aumento de sua saliva e pelo óbvio enrijecimento do pênis, facilmente perceptível, mas o que eu queria te mostrar era realmente meu seio? – É, parece que sim. – Aí que você que se engana, lado esquerdo do peito, é o coração! – Porra, que provocação é essa, não tem medo de eu te agarrar aqui? A praia está deserta. – Não se esqueça que sou psiquiatra e entendo de comportamento humano, com certeza você não vai me agarrar. – E se você estiver equivocada? – Aí já era. Fico sem ação. Ela tem razão. Chutar o balde com certeza passa pela minha cabeça, mas não incluiria estuprar mulheres. E ainda mais mulheres negras. Agora ela vai caminhar. Eu continuo sentado imaginando a situação que beirou o absurdo. É negão, talvez não. Talvez você aprenda algo sobre continuidades.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Na medida do caos...





O que estamos esperando, hein? Que os homens e mulheres inteligentes resolvam o problema de maneira simples e civilizada. Mesa de bar é foda, pois assuntos de ordem mundial surgem com a facilidade de uma golada na cerveja mais barata. Nem é tão barata assim. Simples e civilizador. A proposta de civilização sempre caminhou com a prática de extermínio. É? A bebida é um processo de extermínio. Minando o corpo. Assim com o sexo. Sexo? Pára, pára. O sexo não mina ninguém. Fica 12 horas trepando direto, então. Porra, 12 horas? O contexto etílico dissolve toda e qualquer tentativa de construção de conhecimento. Vem cá, ultimamente você anda muito formal, não consegue mais atingir a sua classe de origem. Classe de origem? É aquela que nos remete a nossa infância. As coisas evoluem. Evolução não é esquecimento. Evolução não é esquecimento. Vou me lembrar disso quando não me reconhecer no espelho. Meus pensamentos estão fragmentados, assim como o papo reto que já fez curva a bastante tempo. Assim como minha cor de pele ainda é motivo de desconfiança por parte das mulheres que tento conquistar. Assim como... ah, sei lá, tenho que buscar algum objetivo nisso tudo. Acorda, acorda rapá! O que, o que? É hoje! É hoje o quê? É hoje que vamos tirar a barriga da miséria. E como vamos fazer isso? Fazendo aquela correria básica. E se a gente for preso, irmão? E se a gente conseguir fazer a correria irmão? Tá vendo. Se não houver riscos, já era o bagulho!

O caos talvez seja a melhor garantia de que as coisas realmente mudem. O fio da meada pode garantir a decisão que há muito tempo pensamos em tomar. É o pensamento que está caótico e não traz nada de novo ao contexto e é a ausência do novo que talvez cause a confusão que te faz pular da cama e chutar o balde. Apesar que a proposta de chutar o balde é para no máximo conseguir uma fratura no pé, porque o balde com certeza vai estar cheio de cimento. Ai! Você pensa e acredita no que quiser. Eu assumo o personagem que desejar. Isto é ruim cara! Isto é ruim. Parece que não tem personalidade. Eh, pareço? É, parece! Ser alguém com personalidade ou ser alguém sem personalidade, eis a questão! Não liga para que esse doido diz, não... Você come gente pra caralho desse jeito! Olha só o canibal.

Estou sentado escrevendo e a observo. Melhor. Observo seu tênis desamarrado. Ela também percebe e desce para amarrá-lo. Tenho que parar de observar essas coisas. Elas acabam ficando sem importância no ambiente. Tá tudo muito estranho e qualquer tentativa de explicação transforma tudo em uma grande merda. Tá certo que todo esse emaranhado só tem um objetivo. Pelo menos é objetivo que quero alcançar. É todo caos que tiramos a força necessária para se mudar. E precisa-se mudar algo. Na verdade, os desejos reprimidos quando liberados são o contexto de provocação do caos reinante dentro da psique dele ou dela, sei lá. Provocações constantes, confissões que não têm nada de comum. O quebra-cabeça se for montado pode provocar a revolução. Pode.